Quando eu era muito
menino,
sabia quase tudo:
que o dia viria
depois da noite,
que viver era
seguir os adultos
com os olhos.
Mas
suava noites a frio
pensando que deveria ser mais
que aquilo
viver.
Na sala,
a rotina escorria:
televisão, escola,
jantares,
lição antes de
brincar e dormir.
Domingo morria
na hora da missa.
E se a vida
era aquilo,
repetir os mais velhos,
por que chamavam isso
de futuro?
Eu deveria perguntar
a deus
mas a pergunta
era a dúvida sozinha.
E me perguntava se
havia mesmo
um deus piedoso
e se havia mesmo
um deus.
Então, comecei a pensar
como se ninguém
tivesse pensado antes:
e se não houvesse nada?
Se nem eu existisse?
Se nem o pensamento
de eu existir
existisse?
Foi numa dessas noites
em que o corpo perde saliva
de tanto silêncio,
que percebi:
se houvesse Deus,
ele me interromperia.
Ele saberia de tudo
ele não permitiria.
E se permitisse, não seria.
Peguei a faca.
Não para morrer,
mas para vê-lo.
Que viesse —
a cena era sua.
Mas não veio.
O corredor seguiu intacto,
os quartos dormiam.
Lá em casa,
só eu sabia.
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